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Quantas árvores você está DEVENDO?
Piloto troca combustível por árvore. Músico compra carbono. Funerária planta muda a cada enterro. Tudo para salvar a Terra
Por Francisco Alves Filho Colaborou Luciana Sgarbi
É preciso rever a antiga receita de realização pessoal que sugere a todo homem escrever um livro, ter um filho e plantar uma árvore – os dois primeiros itens continuam valendo, mas, para saldar nossa dívida ambiental com o planeta, semear apenas uma muda é atualmente quase nada. Essa constatação tem levado pessoas e empresas a uma eficaz iniciativa para amenizar o problema: é a chamada “neutralização”, que consiste em compensar a ação poluente do ser humano com o plantio de árvores, o mais equivalente possível à quantidade de dióxido de carbono (CO2) lançado na atmosfera – a vegetação absorve o carbono e a poluição é neutralizada. “Contribuímos para o aquecimento global quando usamos, por exemplo, materiais não degradáveis ou veículos movidos a combustível fóssil”, diz David Zee, professor de meio ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Para se ter uma idéia, uma família que consome 400 watts de energia elétrica por mês, locomove-se de carro diariamente por 20 quilômetros e produz 800 gramas de lixo por dia, precisa plantar anualmente 12 árvores para equilibrar sua ação poluidora. Um brasileiro vive em média 72 anos e, para compensar o CO2 emitido na atmosfera ao longo desse tempo, teria de reflorestar uma área equivalente a 2,5 campos de futebol (cerca de 19,5 mil m2). E você, já sabe quantas árvores está devendo?
“No ano passado coordenamos 20 projetos de neutralização de carbono. Em 2007 já chegamos a 100”, diz Eduardo Petit, sócio da empresa Max Ambiental. No início, apenas ativistas recorriam a esse expediente. O que se vê nos últimos tempos, porém, é a determinação de grandes empresas, o entusiasmo de pequenos grupos e a adesão das chamadas pessoas comuns. Foi o que fizeram os cariocas Renato Barandier e Izabela Lentino, ambos arquitetos, que se casaram no dia 20 de outubro e decidirem neutralizar as sete toneladas de carbono emitidas na cerimônia. A mesma preocupação moveu o piloto de stock car Allam Khodair, da equipe Boettger, responsável pelo plantio de 59 árvores para absorver o CO2 das três últimas provas da temporada. O conjunto de samba Jeito Moleque tornou-se o primeiro do País a fazer shows “neutros em carbono” e, através da ONG Inciativa Verde, plantou mais de 500 mudas em 2007. Os organizadores do Carnaval baiano já anunciaram que vão neutralizar o carbono emitido pelos trios elétricos em 2008, o Paraná Clube planeja fazer o mesmo com as partidas de seu time e os empresários do último TIM Festival plantaram mudas compensando o gasto de energia no evento.
Cresce também a participação das empresas. Gigantes como a Bradesco Capitalização, Volkswagen e Petrobras, entre outros, começaram a cuidar para valer da natureza no ano passado. Mais: a Ipiranga investe R$ 6 milhões para compensar a poluição dos veículos e a HSBC Seguros lançou o Seguro Carbono Neutro com parte dos investimentos revertida para a preservação das florestas. “Estamos abertos à possibilidade de patrocinar o plantio”, diz Marcelo Teixeira, diretor executivo da seguradora. Mesmo as empresas médias estão agindo. A Tour House, agência de viagens corporativas, vai neutralizar o CO2 emitido nos deslocamentos aéreos. “O combate às emissões é exigência da sociedade”, diz o diretor comercial Mateus Passos. Vale a pergunta: esse plantio influi na diminuição do aquecimento ou apenas alivia as consciências? “A crescente participação das empresas e dos cidadãos pode pelo menos atenuar o problema”, diz Zee. Segundo Adauto Basílio, da Fundação SOS Mata Atlântica, os empresários não podem plantar pensando somente nos ganhos de imagem imediatos. “É preciso continuidade”, diz ele.
Continuidade, perseverança e empenho são palavras-chave nesse caso. Dá trabalho, mas vale a pena. É preciso acompanhar o crescimento da planta, principalmente durante os primeiros dois anos, cortar o capim a sua volta e evitar pragas. A desvantagem de cultivar uma árvore solitária é que, ao morrer, ela também libera carbono – quando está ao lado de espécimes iguais esse efeito é neutralizado. “Seria ótimo se o cidadão conseguisse envolver a família ou os vizinhos para plantar em quantidade”, diz o biólogo Roberto Strumpf, da Iniciativa Verde. Ou seja: a melhor solução é participar de ações coletivas através de entidades especializadas em reflorestamento, porque aí a pessoa paga pelo plantio das árvores em locais adequados, pode acompanhar o momento em que a muda é colocada na terra e recebe um certificado. Antes mesmo de qualquer redução no aquecimento global, essa mobilização tem o benefício de criar um contingente comprometido com a preservação. Gente que para ser feliz pode fazer uma releitura da velha máxima: vale escrever um livro (de preferência em papel reciclado), vale ter um filho (e educá-lo para cuidar da natureza) e vale, sobretudo, plantar não uma mas várias árvores vida afora.
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